A 1.ª Gala da Juventude do Concelho de Peniche, anteontem realizada, foi um acontecimento invulgar e marcante.
Sou altamente suspeito nesta opinião, pelo óbvio motivo de ter contado com o meu neto Manuel entre os galardoados no evento. Mas sei lê-lo com isenção, até porque não fiquei nada surpreendido com a distinção conferida ao Manuel. Tenho a ventura imensa de três netos de qualidade, sendo o Manuel o que exibe uma vocação mais extrovertida e socializante. Esta é uma simples diferença de pormenor que até já aqui mesmo realcei.
A iniciativa da Câmara Municipal de Peniche, com o directo envolvimento do Conselho Municipal de Juventude, é altamente louvável, pelo estímulo que soube criar e concretizar, distinguindo jovens da sua comunidade que merecem ser apontados como exemplo em diversos sectores de actividade interventiva. A cúpula desse trabalho complexo teve dignidade, embora justifique alguns ligeiros apontamentos críticos, no sentido único sob o qual que entendo este exercício, o de colocar em discussão questões merecedoras de eventual aperfeiçoamento.
A animação foi exemplar, começando pelo norte-alentejano José Carlos Malato, um profissional experimentado que se integrou, na perfeição, quer no contexto penichense quer no espírito da cerimónia. Depois, o contributo das intervenções musicais, individuais ou colectivas, teatrais e de dança foi magnífico e oportuno, bem escolhido, revelando também outras vocações locais.
O essencial da Gala foi a entrega pública de trofeus, de bom gosto estético para além do seu profundo simbolismo, a jovens que se tivessem publicamente destacado em diversas categorias (moda, artes plásticas, letras, música, teatro, investigação, empreendedorismo social e empresarial, desporto e profissões), pretendendo valorizar as gerações jovens e incentivar a adopção de atitudes enriquecedoras, enaltecendo, deste modo, as capacidades e o talento demonstrados, bem como um conjunto de valores como a persistência e a dedicação, a tenacidade e a coragem, o altruísmo e a solidariedade, capazes de construir uma sociedade mais inclusiva.
Creio que a organização prévia, sobretudo atendendo a protagonizar uma estreia, foi adequada, divulgando atempadamente um regulamento que possibilitava a candidatura de potenciais premiados através de instituições ou de grupos de cidadãos. A exigência da justificação revelou-se equilibrada, com relevo para a demonstração do mérito, da capacidade e de desempenhos considerados relevantes na categoria em apreço, sobretudo relacionados com o último ano.
Naturalmente, revelou-se desigual a quantidade de candidaturas nas diversas categorias propostas, causando esse facto, a meu ver, o primeiro óbice. Letras e Profissões contabilizaram um total de apenas uma única candidatura, cada uma. Pelo contrário, Música revelou oito, Teatro e Empreendedorismo Empresarial, seis cada, e Desporto, vinte e duas…
O júri teve assim de enfrentar uma dura função, a de julgar méritos por vezes bastante difíceis de confrontar em termos relativos, sendo ainda mais complicada tal tarefa na avaliação absoluta. A atribuição de Menções Honrosas terá suavizado os ingratos resultados do julgamento.
A minha sugestão inclina-se para uma avaliação de contornos apenas absolutos, concluindo pela atribuição de mérito a quem disso for considerado merecedor, depois de sujeitadas previamente todas as candidaturas a um exigente rigor eliminatório de aprovação. Desapareceriam portanto pura e simplesmente as Menções Honrosas e cada categoria poderia incluir vários premiados. Por outro lado, poderia haver categorias previstas sem que isso desse lugar à atribuição de qualquer prémio, se o júri assim o entendesse.
Outro ponto merecedor de uma reflexão séria respeita ao modelo adoptado, com a revelação do nome do premiado em cada categoria num estilo imitativo da Noite dos Óscares, dos Trofeus da UEFA ou dos Festivais da revista Caras, com a abertura, no momento, de um sobrescrito fechado. Verificou-se, na prática, que a dúvida ou incerteza criada pelo sistema afastou da cerimónia -assim foi expressamente declarado- uma jovem atleta penichense de eleição, Telma Santos, que optou por outro compromisso.
Se abdicar do espectacular mas banal e oco show-off que este modelo contém, a organização poderá usar o tempo assim conquistado na leitura integral do currículo de cada vencedor, atitude pedagógica que vale bastante mais…
Ainda a este propósito, não devo evitar dois comentários quanto ao acontecido na categoria Profissões. A única candidatura proposta foi naturalmente premiada e, independentemente do seu reconhecido mérito, achei-a totalmente desfasada em relação ao espírito, civil e cívico, da Gala. São outros e distintos o contexto e o pretexto para tal.
Por outro lado sendo Peniche por excelência a Cidade do Mar, antes de ser a moderna Capital da Onda, na cerimónia de anteontem não se viu reflectida essa sua inegável e característica qualidade. Que me recorde, o mar apenas ali aflorou na personalidade de uma campeã de xadrez que também pratica surf e no meritório trabalho de investigação da Mare – Instituto Politécnico de Leiria. Isentando a organização de toda e qualquer responsabilidade, pergunto às instituições locais da classe marítima se não haveria entre os jovens (14 a 35 anos) um pescador, uma operária conserveira, um trabalhador dos estaleiros navais, enfim, um só representante das dignas e duras profissões do mar merecedor de uma proposta de candidatura. Uma só!?
Peniche é o Mar e não senti este na Gala como merece e justifica.
Regresso às origens e ao incondicional louvor à iniciativa.
Todos os intervenientes directos e indirectos no acontecido merecem parabéns. Peniche viveu um momento que se projecta no futuro, revelando ainda a inexcedível qualidade do cenário de acolhimento, o novel Hotel MH da cidade, instituição que muito valoriza o seu parque hoteleiro.
Como momentos marcantes, para além da sábia e divertida condução de José Carlos Malato, uma presença norte-alentejana que muito valorizou a cerimónia, destacaria a magnífica e inteligente intervenção de Rui Pregal da Cunha, um nome incontornável da música portuguesa, e não só, assim como a gentil e muito segura participação de Sónia Balacó, jovem penichense justamente agraciada como o Prémio Carreira.
A Câmara Municipal de Peniche, o seu carismático presidente, António José Correia, e o seu Conselho Municipal de Juventude deram corpo à Gala da Juventude e garantiram, logo ali, a sua sustentada continuidade. Exemplar comportamento de uma autarquia atenta aos valores demonstrados pelas mais jovens gerações, merece ser considerado como um modelo a perpetuar e a servir de exemplo.
António Martinó de Azevedo Coutinho